Eu precisava tanto escrever, mas por vezes hesitei, disse que não me cabia. Mas que diachos de palavras oblíquas são essas? Isso me reduz ou isso me possibilita? Nem sei mais, talvez isso tenha saído só de algum delírio do adolescente meio pedante que eu fui. Só sei que eu precisava tanto escrever! Para descarregar, para registrar os dias, para botar pra fora e depois internalizar tudo de novo num exercício necessário de regurgitofagia. Mas já tinha se passado tanto tempo! Escrever não é andar de bicicleta, que nunca se esquece, escrever é exercício físico, se não se pratica, atrofia. E a página em branco dá medo, arrepio, calafrio… eu nem sei ainda que texto é esse, se tem nome, cara ou sentimento.
Adio mais uma vez ou sigo em frente? Mas eu precisava tanto escrever! Tantos e quantos textos abortados deixei pelo caminho. Enquanto encarava o nada pela janela do ônibus a caminho do trabalho, textos incríveis bolinavam minha mente e eu deixava ir. Ou ainda, bem quanto eu queria dormir, já contando as poucas horas de sono que teria, me vinha aquele texto maroto querendo brotar. Eu o perdia. Pior ainda, o bloco de notas do meu celular que um dia apagou pra nunca mais voltar a vida e consigo levou tanta coisinha que eu queria trabalhar, explorar e expandir. E aí que me dei conta, eu que precisava tanto escrever, já não escrevia.
Tive medo de me repetir.
Fazia tanta coisa e quando me rebelava, nada fazia. Fiquei tonto da rotina. Correria, acorda cedo, ônibus lotado, estresse às sete, corre pra casa, engole o almoço, ônibus lotado, hora não passa, bate o relógio, ônibus lotado, cai a noite e já é quase outro dia. A roda que roda, o looping dos dias. Passa semana, passa mês, mal vejo, salário na conta, felicidade rápida, acordacedopegaônibuslotado todo dia é o mesmo dia! O horror. Engolia o cansaço com cerveja e me permiti confundir felicidade com o brilho.
Tudo bem, estava sempre tudo bem e eu queria que não estivesse sempre tudo bem para eu poder gastar o mais profundo de mim. Agora aqui, revendo, percebo que nunca estive distraído. Relapso sim, mas talvez devesse ser assim. Não existe tempo perdido – eu dizia outro dia mesmo conversando com uma amiga. Estamos todos onde deveríamos estar. Hoje eu quis me demorar um pouco mais no desconforto. E eu que precisava tanto escrever, escrevi. Ufa! (que interjeição mais feia!)