Onze graus e tudo que o frio traz

Rememorei nosso lance, nossa foda e nossas tretas. Eu ainda lembro o dia em que te perdi: aquele silêncio que a gente estava tão acostumado, um dia ― mas não de repente ― nos cortou. Era um silêncio amargo. Pecamos em ter muitos dedos para não magoar um ao outro. Ou pecamos qualquer outra coisa, não sei, mas sei sim, o dia que a gente se perdeu.

Sou cheio de saudades, acumulo nossas lembranças e nessa noite a minha mente me traiu e trouxe todas elas. Vi à minha frente as suas pintas que eu tateava feito braile e sabia percorrer os caminhos certos que te acendiam. Quanta coisa! Na verdade o que eu tenho é um pouco de medo de não conseguir com outras pessoas o que tive com você. Tenho medo da minha entrega nunca mais ser inteira, ainda que eu queira muito e ainda que eu me esforce e coisa e tal. (Mas, pensei agora, eu nem me esforço, eu tenho essa nóia de que se tiver esforço não é natural… e eu valorizo tanto a fluidez de tudo.)

Ainda que nossa relação fosse intermitente, fluímos demais, né? Eu sei que você não vai ler essa carta porque nem a remeterei, mas sei também que aí onde quer que você esteja, vai também se lembrar de mim nessa noite estranha que deveria ser quente, mas o termômetro marca onze graus.

Sei que de algum jeito meu pensamento tomará forma e vai te alcançar. Ou será que foi sua forma-pensamento que me bolinou essa noite e me fez ficar até uma hora dessas remontando a nossa história de um jeito que me fizesse compreender em precisão o dia em que nos perdemos? Não sei. Só divago. Escrevo em desabafo. Respiro fundo, expiro todo ar que consigo dos meus pulmões. Acho que me livrei de alguns pesos.

Meu rosto já tem tantas camadas de desilusão, você nem acreditaria se visse. Eu, otimista incorrigível, senti o amargo desgosto por mais vezes que eu queria nos últimos dias. Mas tudo bem, eu tô bem e quero tanto que você também esteja.

Eu sempre tive muito medo de usar essa palavra que me veio em mente agora, mas vou escrever assim mesmo porque o que eu mais quero é botar pra fora: amor. Pensei que amor deve ser isso mesmo, nunca tem ponto final. Eu já tinha pensado antes, há anos, mas agora retomei tudo sobre isso: amor não tem ponto final. Me desculpa a afobação e todas as impropriedades sintáticas e coisas do tipo, eu só queria dizer. Só queria dizer. Sem hesitação de ser piegas ― embora enquanto escrevo meu pensamento que já está muito lá na frente em relação à minha escrita e já hesitou umas dez vezes ― eu queria dizer é que eu agora concordo sim que amar não se conjuga no pretérito, é uma impropriedade sentimental. Desculpa se não fui inteiro.

Te guardo com carinho.

Te amo enquanto te lembrar.

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