Supernova

Como se escreve aos trinta? É essa a pergunta que não se cala dentro de mim. Eu soube tanto sobre tudo o que falar na adolescência, desaprendi depois. Sei o que os autores sexagenários escreveram e admiro tanto! Penso e repenso cada linda de Manoel de Barros, Drummond e Quintana que, para mim, parece que eles sempre estiveram ali aproveitando a plenitude de suas velhices, aquietados e satisfeitos com a simplicidade e a pequeneza de todas as cousas. Eu sei que não foi, mas tenho que me lembrar pra saber, porque meu conhecimento consolidado é que poeta já nasce velho. E daí que nesse lance todo, eu não sei escrever aos trinta. Quero que chegue logo o meu tempo de ser velho porque eu tenho um tanto de repertório pra dizer sobre a velhice. Mas falo é da boca pra fora! A maturidade já me pesa e ainda estranho ver minha pele mudar de textura ou as costas sinalizarem em dor a má postura depois de um dia inteiro de trabalho em frente ao computador. E tem ainda meu corpo querendo uma dieta livre de carne, alongamento matinal e coisas do tipo. Ioga não – porque ioga eu acho antipático. E eu falo ióga só de sacanagem. Iôga é coisa nova, inventaram depois. Não que nada disso seja verdade, mas eu entendi assim. Ocupar a casa dos trinta não é só isso, antes fosse. A gente também se torna mais íntimo da morte, não por querer, mas por necessidade. Alguns amigos se vão, você cai na real que seus pais não estão aí pra sempre e, como diz Viviane Mosé, o tempo anda passando a mão em mim. São muitas as verdades óbvias que precisamos encarar, é como nascer de novo. Será que aí no meio tem aquele lance de retorno de Saturno também? Nunca entendi direito de astrologia, mas gosto de falar e divagar. O pensamento voa para esquecer um pouco o peso de saudades que se acumulam. Nem sei se é certo falar de saudade como peso, embora elas adquiram mesmo muito peso em dias que estamos pouco distraídos. E são tantos os outros atributos pesados que tentam nos impor, eu até que lido bem com eles, mas estão aí. Precisa ter filho, casa, casamento, carro, viagem internacional, vinho de safra especial, cabelo bem hidratado, rotina de skincare, tênis com entressola de gel, celular com três câmeras, comer a cebola do Outback – opa!, não mais porque cancelaram o restaurante – viajar no Ano Novo, comprar presente no Natal, ter um perfil ativo nas redes sociais, o feed bem organizado e ter ainda conteúdo pra se encaixar em todas as hashtags. Canso só de pensar em. Visto minha capa de invisibilidade costurada a partir do que rejeito e entendo que o que não gosto também sou eu. E ainda que tentem invasivamente me convencer do contrário, está tudo bem e bem resolvido quanto a isso. Sempre que preciso me explicar me sinto falando o óbvio ululante, absurdado que ainda esperem de mim algum esforço de pertencimento. Eu sei que nada disso tem urgência por agora. Eu sei que tudo isso é espinhoso e pode parecer confuso ou sistemático. E tudo bem. Eu estou cada vez mais interessado nas coisas que eu não sei e a vida ainda me fascina. Isso faz eu me sentir salvo, vivo e são. Talvez eu escreva sobre meus caminhos pra dentro e por dentro. Se eu conseguir chegar lá, eu escrevo sobre como conciliar a necessidade de me interiorizar e a vontade de me expandir; a necessidade de me expandir e a vontade de me interiorizar. E, quem sabe assim, quando sexagenário, eu alcanço a maioridade das minhas pequenezas.

Padrão

Deixe um comentário